
ANÁLISE
Banjo-Kazooie
Urso e pássaro.
Por João Dias a
Quando pensamos nos jogos de plataformas, as atenções voltam-se, por norma, para o maior ícone do género e não é difícil de perceber porquê. A supremacia de Mario nos jogos de plataformas apenas foi contestada por Sonic na primeira metade da década de 1990 e a personagem de bandeira da Nintendo identifica-se de tal modo com o género que os outros jogos acabam por ficar na sombra.
Não admira, então, que a Nintendo tenha criado Super Mario 64 para demonstrar ao mundo a sua consola da 64-bits. Em 1996, Super Mario 64 foi aclamado por muitos como o melhor jogos de sempre e até consta que o “efeito Mario 64” foi de tal forma poderoso que muitos jogos de plataformas em desenvolvimento foram cancelados porque simplesmente não se conseguiriam afirmar no mercado.
No entanto, a década de 1990 trouxe o regresso de uma certa produtora britânica ao panorama – a Rare, com jogos de culto no Spectrum e com jogos no NES desde o final da década de 1980, ganhou novo protagonismo em 1994 graças a Donkey Kong Country no SNES e em 1997, GoldenEye foi o seu maior trunfo na N64. O seu regresso aos jogos de plataformas deu-se com Banjo-Kazooie, em 1998.
Pegando numa personagem que se havia estreado uns meses antes em Diddy Kong Racing, Banjo-Kazooie é um jogo de plataformas (pois claro) em regime de cooperação (tal como Donkey Kong Country) e que se destaca imediatamente por um aspecto visual de luxo e por uma enorme liberdade no plano criativo – Rare em todo o seu esplendor, digamos.
Juntar um urso pacífico e uma ave desbocada num esforço comum para salvar uma vítima (irmã desse mesmo urso, diga-se) das mãos de uma bruxa malvada que fala sempre em verso parece saído de um livro infantil, tal como salvar uma princesa das garras de uma criatura malvada ligeiramente semelhante a uma tartaruga...e as semelhanças com Mario acabam aqui.Banjo-Kazooie é voltado sobretudo para a exploração e para o carisma das personagens envolvidas. Ao contrário de Mario, onde temos um movimento quase imparável, em Banjo-Kazooie temos uma exploração quase cinematográfica e os mundos abrem-se como se de telas se tratassem, tal é a explosão de cores e de contrastes.
Além de um overworld já de si grande e intrincado, temos acesso a mundos que, depois de um começo relativamente simples, ganham contornos cada vez mais estranhos – em quantos jogos é que temos o dever de escoltar um grupo de luzes que se dirigem para uma árvore de natal? E quantas vezes na história dos jogos é que somos despejados, literalmente, por uma sanita abaixo? Uma menção honrosa exige-se para um mundo de quatro estações, bem como para a ante-câmara final antes do combate com a nossa arqui-inimiga, onde o nosso conhecimento do jogo vai ser testado de forma impiedosa. Infelizmente e ao contrário de todos os mundos anteriores, só podemos percorrer esta etapa uma vez...
Tamanhas proezas criativas seriam muito difíceis de imaginar sem uma realização gráfica esplendorosa, mas é exactamente isso que temos em Banjo-Kazooie. Se o aspecto visual de Super Mario 64 parecia impressionante em 1996, Banjo-Kazooie parece ter dado um salto de gigante em apenas dois anos. Não existe uma única superfície que não esteja preenchida de forma exaustiva e o movimento das personagens está por toda a parte, bem como os esplendorosos efeitos dourados e a tonalidade berrante das cores. Banjo-Kazooie é um festival para os olhos e a Rare não tem vergonha nenhuma em exibir tamanha obscenidade gráfica a um público que exigia ver um jogo de altíssimo nível técnico na Nintendo 64.
Outra das maiores forças de Banjo-Kazooie é a sua profusão de personagens secundárias, algumas das quais com intervenções verdadeiramente inimagináveis. Além de um feiticeiro presente em cada mundo e que, perante uma soma adequada, nos transforma em algo que nos ajuda a progredir – salvo o ocasional erro em que a dupla de personagens é transformada num objecto muito pouco prático para uma aventura deste calibre – temos direito a criaturas como um crocodilo vermelho que faz batota nas apostas, uma mão fantasmagórica que toca órgão, caldeirões dispostos a serem usados como atalhos, um balde de praia que devemos encher e que não sabe falar devidamente, as referidas luzes de natal que devemos escoltar em segurança até à árvore ou um camelo que pede para ser libertado do seu cativeiro. Todas as personagens, por mais curta que seja a sua intervenção, têm direito a fonemas próprios, já que em Banjo-Kazooie não existem vozes mas sim uma série de sons que identificam cada personagem, bem como a um grande par de olhos, seja a personagem em causa uma abelha, uma sanita ou um balde de praia. A exploração é feita numa curva progressivamente ascendente, já que no início os movimentos da dupla Banjo e Kazooie são bastante limitados, mas à medida que avançamos desenvolvemos novas actividades, incluindo, claro está, a possibilidade de voar, bem como a invencibilidade – que vai ser necessária para poder, por exemplo, atravessar um corredor dividido por hélices que se movem a alta velocidade. Neste aspecto, temos um sistema de controlo que, embora não atinja a mesma fluidez que seria de esperar depois de jogarmos Super Mario 64 (lá está ele a meter-se outra vez onde não é chamado...), encontra-se bastante perto do padrão ideal e raramente ficamos com a sensação de que a nossa dupla de personagens não cumpre o que pretendemos.
Conclusão
Banjo-Kazooie é um jogo que dá um enorme prazer explorar até à exaustão e onde os pormenores são de tal forma abundantes que simplesmente acabar a história do jogo não é, nem de perto nem de longe, suficiente. É preciso apanhar todas as peças dos puzzles, todas as notas musicais, todos os elementos que os mundos nos oferecem, falar com todas as personagens e vasculhar todos os recantos de todos os mundos...e mesmo assim, ainda podemos ser surpreendidos. Não podemos deixar de pensar que...ao acabar o jogo, que crueldade da parte da Rare...em deixar-nos dois pequenos elementos por utilizar e ainda por cima, darem-se ao luxo de nos dizer, na nossa cara, que há elementos que só vamos poder utilizar no próximo jogo...por tudo isto, Banjo-Kazooie é um dos melhores jogos da Nintendo 64 e que merece todo o nosso tempo e atenção. Encontrem-no e explorem-no...o turbilhão começa logo no écran de selecção do ficheiro, se tivermos um timing suficientemente bom.
O melhor
- Criatividade vísivel nos mundos e personagens
- Viciante exploração dos mundos que nos deixam com pena quando terminámos
O pior
- Como todas as coisas boas...tem um fim