
ANÁLISE
Super Smash Bros. Ultimate
O derradeiro confronto.
Por Henrique Pereira a
Entre as muitas séries consagradas e adoradas da Nintendo, talvez nenhuma seja capaz de gerar a expectativa e antecipação como Super Smash Brothers. Esta combinação de um jogo de luta com várias personagens e universos Nintendo (com uma pitada de outras séries famosas vindas de fora) não tem rivais entre os fãs da gigante nipónica pela sua natureza mas também pela forte comunidade competitiva e extensão de conteúdo. Na mais recente entrega, esta expectativa parece ser maior que o normal, ou não tivesse o jogo o subtítulo de Ultimate, sendo que o próprio realizador da série, Masahiro Sakurai, afirmou que este seria o apogeu dos Super Smash Bros., apresentando alguns argumentos de peso como a quantidade absurda de personagens, cenários ou música. Agora que já testámos o produto final, podemos realmente averiguar se corresponde mesmo a esse título.
Obviamente que Super Smash Bros. Ultimate mantém a sua jogabilidade frenética que mistura um jogo de luta com as mecânicas de um jogo de plataformas, sendo que o objectivo habitual é enviar o(s) adversário(s) para fora do cenário. Entre combates intensos a dois jogadores sem interferências do cenário e de itens externos e as batalhas caóticas até oito participantes onde tudo pode acontecer, a série Smash Bros. proporciona grandes momentos de diversão a qualquer tipo de jogador. Neste novo capítulo a jogabilidade é ainda mais rápida e insana, graças a um conjunto de pequenas mudanças e ajustes nas mecânicas base. Ainda que um jogador menos experiente não sinta grandes diferenças em relação ao anterior para além da rapidez, os jogadores mais competitivos vão ficar satisfeitos com algumas destas alterações.Mais importante que as mecânicas são as personagens, especialmente as novas. Não só marcam presença todas as que estiveram nos jogos anteriores como o leque de estreantes responde a alguns dos pedidos mais frequentes dos fãs. Personagens como Ridley, King K. Rool ou Simon Belmont fazem finalmente parte do elenco, assim como os esperados Inkling, Incineroar e Isabelle. Além disso, o novo sistema de Echo Fighters vem dar outra imagem aos mal-amados clones e permite a lutadores como Dark Samus, Chrom, Daisy ou Ken estarem no jogo sem nada de negativo a apontar. A série Smash Bros. é conhecida pela qualidade e fiabilidade com que transporta personagens de diferentes universos para o seu mundo e Ultimate não desilude.
Entre as animações provocadoras de Incineroar, o andar e ataques de ambos os Belmonts até à mecânica de tinta dos Inklings, é impressionante como conseguem ser tão fiéis aos seus jogos de origem, o que por sua vez traz imensa variedade aos lutadores. Os veteranos receberam inúmeras novidades, como um novo visual e ataques para Link vindos de Breath of the Wild ou finalmente Ganondorf a usar a sua espada em alguns ataques. Mas as personagens não ficam por aqui porque o sistema de cores permite a certos lutadores não só usar um fato completamente diferente (como por exemplo o Mario construtor de Super Mario Maker), como jogar com a versão do sexo oposto no caso do Inkling, ou até personagens diferentes no caso dos Koopa Kids, que são escolhas alternativas de Bowser Jr. Ultimate tem opções para todos, sem comparação a nível do elenco.A complementar as personagens estão os inúmeros cenários que representam algumas localizações ou níveis icónicos da história dos videojogos. Especialmente desde o último capítulo da série, os cenários vão muito além de uma simples arena de combate, integrando agora mecânicas que alteram completamente a dinâmica da batalha e que mais uma vez, são uma representação fiel da série de onde vêm. No Dracula’s Castle da série Castlevania é possível interagir com as velas, que deixam itens tal como no jogo original. Apenas existem quatro novos cenários mas a quantidade de trabalho despendida é impressionante. Não só quase todos os níveis dos jogos anteriores estão presentes (perfazendo mais de cem), como todos levaram melhorias visuais, com especial atenção aos que nunca saíram do nível visual da 3DS, Wii e GameCube e que se encontram agora ao nível dos mais aprumados. A excepção vai para os cenários vindos do primeiro jogo para a Nintendo 64, que mantêm o aspecto original por questões de nostalgia, o que parece uma escolha perfeitamente compreensível. Para além do modo Omega, que permite a todos os cenários terem a disposição do cenário conhecido como Final Destination, existe o mesmo sistema para a estrutura do cenário Battlefield, sendo assim possível jogar com qualquer música ou localização nos dois cenários mais simples do jogo. Finalmente é muito bem-vinda a adição do modificador “sem perigos”, que permite a todos os níveis conservar a sua estrutura base sem as mecânicas que afectam as batalhas, algo que vai agradar aos jogadores mais puristas mas também aos jogadores que achem aquelas mecânicas frustrantes.
Vistos os aspectos nucleares de Smash Bros. Ultimate, convém perceber as evoluções e melhorias nas partes menos consistentes. Começando pela interface e usabilidade, um aspecto bastante criticado no jogo anterior, houve uma evolução significativa, especialmente na usabilidade. Com menus mais organizados, longe estão os dias onde se andava à procura de uma funcionalidade específica dentro de uma multiplicidade de opções. A própria qualidade das animações, tempos de resposta e transições ajuda imenso nesta melhoria. Mais importante é a facilidade de navegação, onde se incluem atalhos rápidos, opções de organização de conteúdos ou a possibilidade de guardar regras personalizadas para vários modos de jogo. Finalmente uma interface ao nível da personalização e quantidade de conteúdo de um Super Smash Bros.Nenhum modo de jogo em Super Smash Bros. é tão apreciado como o modo aventura. Devido à sua ausência em Smash 3DS/Wii U, muitos desejavam o seu regresso. Desta vez e sob o nome de “World of Light”, em vez de níveis de plataformas intercalados com batalhas explora-se um vasto mundo 2D através de uma rede de caminhos pré-definidos, povoados por imensas batalhas personalizadas. Os caminhos são fixos mas o jogador tem total liberdade de escolher os que quiser seguir. O mundo começa coberto de nuvens e a exploração vai revelando novas áreas, que são quase sempre referências aos universos presentes no jogo e perfeitamente integradas. Mesmo sendo um simples mundo ilustrado gigante, a qualidade que exibe é surpreendente e agradável de olhar na sua totalidade quando completo. Além da exploração e batalhas, grande parte das vezes é necessário completar o que se pode chamar de masmorras, áreas separadas do mapa principal com uma temática de uma série específica e que estão mais trabalhadas, apresentando pequenos puzzles e uma progressão mais linear. Mesmo sendo simples algumas destas masmorras dão um prazer tremendo em completar devido às particularidades da série que representam.
No entanto, o aspecto chave do modo World of Light é o sistema de espíritos. Este sistema transforma o World of Light num pseudo RPG, onde se pode equipar os lutadores com espíritos primários e secundários que, entre outras coisas, determinam os atributos principais e que se podem fazer evoluir através de um sistema de níveis. Os espíritos estão categorizados por potencial e especialização e influenciam tanto o jogador como o adversário, representando o espírito deste numa tentativa de simular um combate. Nem todas estas tentativas funcionam como se espera mas simular mais de mil espíritos diferentes foi um trabalho hercúleo neste esforço de personalização. A influência dos RPGs sobressai, já que o jogador vai ter de escolher um espírito primário suficientemente poderoso e espíritos secundários que ajudem a mitigar as condições adversas da batalha, com um sistema de habilidades mais uma vez inspirado nos RPGs, lojas para comprar espíritos e ginásios para os fazer evoluir ou realizar alterações.Se a nível da estrutura, o modo World of Light tudo tem para criar uma aventura em nome próprio, a quantidade gigantesca de batalhas diminui muito desse potencial. Mesmo não sendo necessário completar muitas delas para se chegar ao fim, continuam a ser demasiadas, acabando por se tornar numa tarefa frustrante e repetitiva, por muito engenhosas que sejam. Além disso, o facto de haver tantas e a facilidade com que se obtêm e evoluem espíritos faz com que raramente se tenha de procurar activamente outros espíritos para fazer frente às condições únicas de certas batalhas. Com uma duração de quinze a vinte e cinco horas, facilmente se poderia cortar para metade o número de batalhas sem qualquer prejuízo. Os espíritos também se encontram noutros modos de jogo, nomeadamente no Spirit Board que contém de forma exclusiva mais de um terço dos espíritos do jogo, e estes substituem os troféus coleccionáveis dos jogos anteriores. Se existem batalhas de espíritos a mais, existem “bosses” a menos, normalmente no fim das masmorras. Não que o número total destas não seja respeitável, mas a qualidade e a forma como estão pensadas é tão boa que leva a suspirar por mais. Mais uma vez a forma como são fielmente reproduzidas faz delas algo fantástico, onde o exemplo maior é a batalha contra o Rathalos da série Monster Hunter e que conta com pormenores únicos.
Fora do World of Light, o modo Clássico foi renovado, sendo que cada personagem tem uma progressão pré-definida e com uma temática própria, o que torna mais apetecível e interessante de terminar. O modo Mob Smash engloba os vários modos de sobrevivência, tanto contra cem adversários em Century Smash como contra adversários difíceis em Cruel Smash e também contra todos os lutadores num modo All-Star com uma estrutura diferente, sendo agora uma batalha ao estilo de Mob Smash em vez de uma série de batalhas individuais contra todas as personagens do jogo. A nova estrutura é competente, mas podia ter-se mantido igualmente a anterior. O modo Treino recebeu enormes melhorias, com muito maior personalização e informação útil para quem quer jogar de forma competitiva. É importante mencionar que todos estes modos são possíveis de jogar cooperativamente.Outra novidade são os novos formatos de batalha sob a forma de Squad Strike e Smashdown. O primeiro permite a duas equipas com três ou cinco personagens diferentes lutar automaticamente, com a possibilidade de escolher se é uma batalha seguida, por eliminação ou com combates únicos. O segundo é uma série de batalhas onde cada jogador escolhe uma personagem, sendo que na seguinte já não se podem repetir. Ambos são formatos interessantes que já se podiam fazer à mão, mas estando incluídos no jogo facilitam imenso o trabalho. Já a componente online é completamente díspar em diversos aspectos: alguns bons, outros piores do que no jogo anterior, e outros que se mantiveram iguais e não deviam. Começando pelo cerne, que é a qualidade da ligação e a latência nos combates, parece ter havido uma melhoria, visto que tanto em combates singulares como a quatro jogadores, Ultimate apresenta uma boa fluidez, mesmo usando uma ligação Wi-Fi. O problema é que isso não acontece sempre, muitas vezes encontram-se jogos com latência porque o peso da qualidade das respectivas ligações de cada jogador é sempre o factor determinante, e tendo em conta que a Switch não tem uma entrada própria de cabo de rede, é comum encontrar jogadores com más ligações. A nível do sistema automático e para encontrar jogos, em vez dos dois modos “For Glory” e “For Fun”, pode-se definir um conjunto de regras e procurar por adversários com a mesma preferência. O problema é que o jogo não garante que o emparelhamento seja feito dessa forma, o que se torna muito frustrante e não faz sentido.
A ideia de haver um leque maior de regras possíveis a usar online é boa e aproveita a variedade da série Smash Bros. mas o medo de deixar os jogadores à espera de um combate durante demasiado tempo falou mais alto, algo que até é mitigado pelo novo sistema de procura de fundo que permite aceder e jogar vários modos enquanto se procura por um adversário e que funciona muito bem. A outra possibilidade é usar as chamadas arenas de batalha, que essencialmente são "lobbies" que permitem até oito pessoas e onde se definem as regras e formatos, havendo a possibilidade de as tornar públicas ou privadas e até de as proteger com uma palavra-passe. A ideia até está bem implementada mas mais um vez, cometeu-se um pecado capital que foi a impossibilidade de haver mais que um combate ao mesmo tempo, o que leva os jogadores participantes a ter de esperar numa fila sem que possam jogar entre eles. Finalmente, houve uma diminuição drástica de funcionalidades adicionais online, como a possibilidade de partilhar e ver repetições de combates, partilhar imagens e Miis e apostar no modo espectador, algo que talvez seja resolvido pelo serviço Smash World em 2019.Finalmente, existe uma quantidade incrível de outras opções para explorar, sejam estatísticas detalhadas, personalização das músicas em cada cenário, sistema de repetições com a possibilidade de criar vídeos ou desafios específicos com recompensas. Mesmo com esta quantidade gigante, nem todos os modos dos jogos anteriores foram incluídos em Ultimate. Se alguns não fazem falta, como o mal-amado Smash Tour ou o Target Blast, é uma pena que alguns clássicos não estejam presentes como o Home-Run Contest ou que o Break the Targets ou Board the Plataforms não tenham regressado.
Super Smash Bros. Ultimate mostra que apesar do que muitos pensaram ao primeiro contacto, é um jogo visualmente mais desenvolvido que o anterior. Mesmo que não se trate de um salto de gigante da Switch em relação à Wii U, notam-se claras melhorias na modelação, bem como nos efeitos de luz, conferindo-lhe um visual muito mais apelativo, limpo e consistente. A banda sonora é algo a que nenhum jogo se pode comparar, nem seria justo porque Ultimate tem mais de oitocentas faixas, muitas delas são os temas mais conhecidos do meio e a quantidade de excelentes “remixes” de clássicos, feitos pelos mais badalados compositores, é assombrosa. E claro, a música original criada para o jogo também sobressai, incluindo ainda quase todos os originais dos seus antecessores. Compreende-se se alguém comprar Smash Bros. Ultimate só pela banda sonora, contando até com a possibilidade de criar “playlists” que funcionam mesmo com a Switch suspensa, ainda que não que seja muito prático. Não se devem descurar os efeitos sonoros que transmitem na perfeição muita da identidade das séries. Ultimate é uma ode e um autêntico museu da música dos videojogos.
Conclusão
Será Super Smash Bros. Ultimate o apogeu da série? Que é o melhor não há dúvidas, mas ser o apogeu implica que é difícil imaginar o que mais e melhor poderia ter sido feito. Se nos aspectos nucleares da série, ou seja, cenários, opções, personagens, música, visuais e jogabilidade essa descrição provavelmente é verdadeira (o que significa que para muitos pouco mais importa), para outros a falta de alguns modos icónicos e a execução menos feliz de um modo aventura cheio de potencial e com aspectos brilhantes faz com que ainda não seja realmente o expoente máximo da série...o que não significa que não seja um jogo obrigatório para qualquer possuidor de uma Switch.
O melhor
- Enorme elenco
- Conteúdo interminável
- Grandes melhorias a nível de interface e usabilidade
- Banda sonora incomparável
- Uma verdadeira homenagem ao mundo dos videojogos
O pior
- World of Light não cumpre o seu potencial
- Falta de alguns modos como Home-Run Smash
- Componente online com decisões muito questionáveis
Nota: Esta análise foi efectuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela Nintendo.
6 de Dezembro, 2018, 13:04