
ANÁLISE
Monster Boy and the Cursed Kingdom
Bonito tributo.
Por Pedro Meleiro a
No seguimento de uma campanha no Kickstarter do estúdio parisiense Game Atelier para angariar fundos para uma sequela de Flying Hamster, surgiu uma proposta para o desenvolvimento de um novo título no universo de Wonder Boy a ser publicado pela FDG Entertainment em colaboração com a SEGA e com a participação de Ryuichi Nishizawa, o criador da série original. Como consequência, a campanha de angariação de fundos de Flying Hamster II acabaria por ser cancelada, dando lugar a um ciclo de desenvolvimento focado em Monster Boy and the Cursed Kingdom, como viria a ser baptizado mais tarde.
Monster Boy and the Cursed Kingdom apresenta-se com uma estrutura de jogo que pode ser inserida no subgénero dos "metroidvania": um jogo de acção em 2D onde o jogador adquire novas mecânicas que lhe permitem explorar locais antes inacessíveis. Em títulos anteriores da série, como Wonder Boy III: The Dragon's Trap e o seu recente "remake", estava já presente a ambição de enveredar por uma abordagem menos linear e contrária ao estabelecido pelos arquétipos dos jogos de plataformas 2D. A inexistência de uma estrutura por níveis e a aquisição de poderes perenes que permitem acesso a novos locais são dois sinais dessa ambição; ainda assim, o foco continuava a ser a acção. O incentivo à exploração e resolução de quebra-cabeças que põem à prova as mecânicas obtidas encontravam-se relegadas para segundo plano.Em The Cursed Kingdom temos um jogo pronto a exigir do jogador uma veia exploratória, com múltiplas salas e caminhos bloqueados desde o momento inicial. Para isso, e mantendo vivo o ADN da série, o jogador deve tirar proveito das múltiplas transformações para chegar a novos pontos do mapa: a cobra consegue atravessar pequenos buracos e escalar determinadas paredes, o sapo pode utilizar a língua comprida para alcançar locais distantes, o leão faz uma placagem capaz de partir certas paredes, e por aí adiante.
Para obrigar a uma gestão responsável e mais democrática das transformações, a Game Atelier teve a perspicácia de criar inimigos com fraquezas diferentes e de colocar vários tipos de obstáculos ao longo dos cenários, obrigando o jogador a pensar duas vezes sobre os meios a recorrer enquanto avança na aventura. Também as batalhas contra os "bosses" foram feitas em torno da utilização de um poder ou uma transformação específica, actuando como testes que colocam à prova o domínio do jogador de toda a panóplia de mecânicas ao dispor.
Também as armas adquiridas e magias consumíveis desempenham um papel preponderante nesta dinâmica de mecânicas de jogo. Embora actuem frequentemente como adjuvantes, em certas situações-chave é necessário recorrer a uma magia de fogo para queimar um obstáculo ou utilizar uma espada de gelo para congelar um curso de água e com isso criar um caminho, ou umas botas pesadas para pressionar um botão que activa plataformas. A maioria das interacções é óbvia e reciclada de outros jogos mas vale a pena voltar a elas quando aplicadas de forma responsável e divertida, como se reflecte na maioria das situações. Ainda assim, alguns jogadores poderão torcer o nariz à obrigatoriedade das magias para progredir quando estas são em número limitado, mas o jogo está desenhado para que sejam fáceis de recuperar quando necessário.Esteticamente The Cursed Kingdom adopta uma linguagem próxima da que foi apresentada com o "remake" de The Dragon's Lair em 2017 mas mais refinado, exibindo um estilo de filme de animação com cores vibrantes e animações expressivas, principalmente no leque de personagens principais. Em contrapartida, existem falhas ocasionais em algumas animações de pré-aviso de ataque dos inimigos, falhas essas que podem levar a que o jogador seja atingido sem tempo de reacção para o evitar. De resto, a construção dos cenários denota uma atenção ao pormenor que torna o universo do jogo vivo e credível. Também a variedade visual entre os locais do mapa contribui para uma experiência onde é importante ter um bom sentido de orientação, já que é esperado voltar atrás para explorar locais antes inacessíveis.
Conclusão
De forma algo surpreendente, Monster Boy and the Cursed Kingdom é uma proposta viável dentro do universo cada vez mais concorrido dos "metroidvania". Destaca-se dos demais por trazer de forma simbiótica as mecânicas, humor e estética do legado que carrega para um género de jogos que se foi estabelecendo e refinando nos últimos anos graças à explosão de jogos indie. Faz muito pouco por criar algo novo mas perante aquilo que aqui é apresentado, a Game Atelier aparenta ter estudado de forma exemplar as suas lições e pavimenta o caminho para um futuro promissor.
O melhor
- Aventura bem estruturada
- Esteticamente vibrante e bem disposto
- Mecânicas de Wonder Boy integradas de forma simbiótica
O pior
- Falhas ocasionais
- Poucas novidades face à concorrência
Nota: Esta análise foi efectuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela FDG Entertainment.