
ANÁLISE
CLANNAD
Uma emocionante aventura.
Por Beatriz Varela a
Estamos em Abril. No Japão, este mês marca o início do regresso às aulas, e é quando as cerejeiras estão carregadas de pequenas flores rosadas, cujas pétalas facilmente se desprendem e sobrevoam pela paisagem. Uma chuva em câmara lenta de centenas e centenas de "sakuras" emolduram um caminho difícil até à escola. Não é por falta de gosto que ela não dá o primeiro passo, aliás, o seu espírito irradia positivismo. Mas, por outro lado, ela sabe que algum dia as coisas irão mudar. “… Anpan!”
CLANNAD é um "visual novel" polivalente, cujo enredo tanto inclui elementos de comédia, romance e do chamado "slice of life", como de drama e outros sentimentos capazes de deixar alguém num estado absolutamente lastimoso (algo complicado de justificar a quem entra pela porta dentro sem nenhum contexto prévio). CLANNAD foi o terceiro "visual novel" desenvolvido pelo estúdio KEY, depois de Kanon e AIR.
Lançado em 2004 para PC, adaptado para o formado BD em 2005, transformado em série de animação em 2007 pelo eterno estúdio Kyoto Animation e em longa metragem de animação pela icónica Toei Animation, CLANNAD também está disponível para várias consolas, desde a PlayStation 2 até à Nintendo Switch.CLANNAD chegou à Nintendo Switch em formato digital a 4 de Julho mas apenas o Japão teve direito a um lançamento físico na mesma data. No entanto, a Sekai Games (My Girlfriend is a Mermaid!?, Root Double: Before Crime*After Days e A Magical High School Girl), em parceria com a Limited Run Games (Yooka-Laylee, Furi e Shantae and the Pirate's Curse), irá lançar uma edição física muito especial no Ocidente: uma cópia fiel da primeira edição limitada japonesa para PC de Clannad (adaptada agora para a Switch, claro). Ainda não existe data de lançamento, ainda assim os extras deixam qualquer um a sonhar: para além da versão física do jogo, esta edição incluirá um guia e a banda sonora do jogo, tudo bem arrumadinho numa linda caixa que terá Nagisa representada agarrada ao seu chapéu de chuva.
A versão Switch de Clannad é exibida em 1080p e apresenta um som "surround" 5.1. O jogo também tem uma função chamada "Dangopedia" quando jogado com textos em inglês, esta funciona como uma ferramenta de referência útil para vários termos e palavras-chave utilizados na cultura e tradição japonesas e que ajudam a entender melhor a história.CLANNAD porta-se bastante bem tanto na televisão como no ecrã da Switch, sem perdas de fludez nem bloqueios inesperados. Por ser adaptado à Switch, esta versão inclui várias funcionalidades no ecrã tátil, incluindo um método de controlo que suprime os Joy-Con. O jogador pode usar gestos de deslize que, brilhantemente, acionam tanto o menu como o registo de ações já feitas. É exatamente assim que qualquer entusiasta de um "visual novel" gostaria de viver a experiência na Switch.
O jogador tem acesso aos recursos normais, como "auto events", saltar diálogos já lidos e ir diretamente para as opções futuras ou prévias (no caso de o jogador sentir que fez a escolha errada). Uma função que pode vir a ser muito prática é desativar a suspensão automática da Switch. O estilo da animação é decididamente algo antiquado, exibindo a síndrome do “olho gigante” e feições anatomicamente desfasadas, mas isso é algo que os fãs aceitam como uma caraterística KEY. Todavia, as renderizações e os cenários são cheios de pormenor.A história é apresentada num formato padronizado de "visual novel" em que o jogador lê o desenrolar do enredo até que lhe sejam dadas escolhas para prosseguir. Estas escolhas afetam o resto da narrativa e qual o final que o jogador consegue atingir. CLANNAD na Nintendo Switch está disponível com idioma japonês e legendas em inglês e japonês. Todas as personagens têm voz (à exceção da personagem principal) que não só sustenta a personalidade de cada uma, como também confere uma experiência mais rica e interessante ao jogo.
A personagem principal chama-se Okazaki Tomoya, embora o nome possa ser alterado no início do jogo. Tomoya é um delinquente, mas não porque roube ou porque se meta em lutas, apenas porque chega constantemente atrasado às aulas e tem uma taxa de assiduidade muito baixa. Esta atitude é fundamentada pelos problemas familiares que Tomoya enfrenta desde o falecimento da sua mãe, e que pioraram dois anos antes do início do enredo. Tomoya não conhece o conceito “amor à vida”, nem este faz sentido no seu contexto; mais vale desperdiçar o tempo que ainda resta da escola secundária, pois ao menos assim não se desilude. Mas não está sozinho: Sunohara Youhei é o seu melhor amigo, e também um delinquente. Ambos são da mesma turma e Sunohara tem um papel bastante presente em todos os finais. Por muito gozado que seja, Sunohara é fiel e dedicado aos amigos, mas facilmente arranja desculpas para andar à pancada com qualquer pessoa. Existem muitos aspetos sérios ao longo do enredo, como acontecimentos dramáticos e trágicos, mas os elementos cómicos inseridos nas alturas perfeitas conferem um equilíbrio muito bom em qualquer história que o jogador escolha, seja com patetices por parte de Sunohara, seja com piadas sobre pão.A primeira parte de CLANNAD ramifica-se em onze finais, dependendo das decisões tomadas ao logo do jogo. Ou seja, nada muito fora do normal para uma obra deste género. Talvez o mais notável seja a sua duração: completar todos os finais e extras da primeira parte e seguir para os três finais seguintes impõe uma duração de mais de setenta horas.
Cada um dos finais da primeira parte permite que o jogador se torne como que um namorado de uma das raparigas que vai conhecendo, sendo possível entendê-la melhor. A envolvência com cada rapariga é uma experiência imersiva, sendo muito fácil sentir empatia e palpitações por qualquer uma delas. Existem muitas personagens na primeira metade do jogo. O jogador apenas tem de fazer as suas escolhas de diálogo e, eventualmente, conseguir o final com a personagem escolhida, especialmente se usar um guia. Mas a segunda parte do jogo é mais difícil de aceder, estando dependente de cumprir uma das histórias e de obter uma série de recompensas que se desbloqueiam ao completar alguns finais. Satisfeitos esses requisitos, o jogador tem finalmente acesso ao chamado "After Story Arc". E é aqui que a desculpa das cebolas deixa de fazer sentido, porque fungar compulsivamente agarrado a um Pro Controller, com várias caixas vazias de Kleenex ao lado e a olhar turvamente para um ecrã que transmite a história dolorosa narrada nesta parte do jogo é assumir que se tem níveis de empatia e sentimentalismo acima da média dos meros mortais.Ao apanhar mais recompensas o jogador tem acesso ao auto-proclamado verdadeiro final de CLANNAD, que após concluído permite ao jogador considerar que o jogo está terminado. CLANNAD tem ainda uma história secundária conhecida como "Illusionary World". Embora pareça ter pouco a ver com o enredo principal, as suas origens são explicadas ao chegar ao verdadeiro final. Clannad na Switch consegue distinguir impecavelmente entre todas as histórias e dá a importância devida a cada uma das personagens naquilo que é uma obra capaz de impressionar qualquer fã, seja pelos momentos tristes e sentimentalmente destrutivos, seja pelos momentos cómicos.
Da próxima vez que ouvirem alguém exclamar o nome de um tipo de pão sem nenhum contexto, parem. Essa pessoa pode estar a passar por um período terrível da vida e a única motivação que tem é o tipo de pão que lhe apetece comer nesse dia. O mundo já é injusto e ingrato por si só, e não sabemos quando é que alguém precisa de ser salvo. E tudo pode começar com um simples “Olá...”.
Conclusão
A versão de CLANNAD na Nintendo Switch é a melhor versão do jogo. Tem tudo o que as outras versões ocidentais oferecem e mais. E com o futuro lançamento da versão física no Ocidente, é, sem dúvida nenhuma, uma adição de alta prioridade na lista de desejos de qualquer apaixonado por "visual novels".
O melhor
- Banda sonora
- Identidade artística bem definida
- Personagens heterogéneas
- Histórias memoráveis
- Jogabilidade adequada e melhorada
- Formato portátil no Ocidente
O pior
- Preciso de me assoar outra vez
Nota: Esta análise foi efectuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela PROTOTYPE.
13 de Setembro, 2019, 10:04