
ANÁLISE
Rune Factory 4 Special
Agricultura, combate e amor.
Por Ulisses Domingues a
Entre o catálogo impressionante da Switch encontram-se jogos com uma grande variedade de géneros e estilos mas Rune Factory 4 Special parece ter tentado incluir elementos de tudo o que existe. Trabalhado e desenvolvido pela Neverland a partir da sua versão para a 3DS (apresentada no mercado europeu em Dezembro de 2014), está agora disponível para a Switch. Para os iniciados na série, Rune Factory é resumidamente Harvest Moon com espadas. Há cinco anos a análise sobre a versão 3DS no FNintendo concluiu que se tratava de um jogo “divertido, viciante e extremamente agradável de se jogar”. Felizmente o mesmo continua a ser aplicável a este título, apesar de um percalço ou outro.
Tendo em conta o sentimento de leveza que Rune Factory 4 Special transmite, é expectável que o enredo não prime por uma história de cariz épico, repleto de sequências cinemáticas dramáticas. Até é bastante previsível quando algumas páginas do seu livro se revelam perante o jogador, não fosse o enredo iniciar com um protagonista amnésico. Ainda assim é um conto com o seu charme, e parte do que transforma este jogo tão relaxante, para o bem e para o mal do enredo, é a oportunidade de avançar na história ao gosto de cada um. No entanto, esta variante é um pouco dissonante quando existem forças do mal a conspirar contra o estado pacífico do mundo.Mais do que a soma de todas as partes, o verdadeiro diamante por lapidar encontra-se no elenco variado de aldeões que pernoitam todos os dias em Selphia. São estas as personagens que transmitem um sentimento acolhedor e confortável, em grande parte graças às suas personalidades muito divertidas. À medida que a enxada trabalha o campo e a espada derrota mais um inimigo, estas personagens habituam-se ao avatar do jogador e o sentido de humor muito próprio, por vezes até bizarro, vem ao de cima e nunca falha em rasgar um sorriso ou dois.
A agricultura em Rune Factory 4 Special é um ponto forte e viciante de toda a experiência. Com o passar do tempo esta torna-se a fonte principal de receita do jogador que permite investir nas suas aventuras fora de Selphia. Hora a hora e dia a dia, o esforço tem de ser constante para apostar num terreno limpo, livre de sujidade e repleto de hortícolas saudáveis e deliciosas. Esta actividade agrária liga-se ao crescimento da cidade, pois muitos dos pedidos dos aldeões provêm do sustento da terra, satisfazê-los desbloqueia novas sementes para plantar durante as quatro estações. Para aprofundar este sistema está a possibilidade de confecionar iguarias que providenciam estímulos estatísticos ao avatar, assim como passar uma tarde calma a pescar.Já o combate, apesar da simplicidade, cimenta a sua posição como um alicerce deste jogo. O avanço é pautado por atacar, bloquear e esquivar, mas nunca deixa de ser divertido. Para além disso, o herói (ou heroína) consegue desbloquear e invocar magias dos vários elementos para apimentar todos os seus confrontos. Desta forma, toda a exploração feita fora de Selphia e dentro das masmorras é um assunto simples de procura por tesouros (que também podem ser vendidos como outra fonte de receita). Mas um confronto físico e agressivo não tem de ser sempre a resposta, a personagem principal pode recrutar vários monstros para trabalhar no terreno a troco de uma oferta apetecível.
Outra particularidade é uma novidade na série com o nome de "ordens". Enquanto o avatar do jogador completa pedidos e demandas em nome dos aldeões, os pontos recebidos pelo seu cumprimento permitem não só melhorar a personagem principal em certos aspetos mas também, por exemplo, aumentar o espaço do frigorífico ou da arrecadação. Com esta pontuação é também possível enriquecer Selphia e inaugurar um leque variado de festas e concursos, actividades divertidas que fortalecem os laços de amor ou amizade com todas as personagens.
No entanto, o que seria da vida sem um pouco de romance? À parte da enxada e da espada, o avatar constrói laços românticos com as outras personagens através de conversa diária, prendas ou de um convite para uma ida entusiasmante a uma masmorra perigosa. Afinal, haverá algo mais amoroso do que enfrentar um perigo de morte juntos? Talvez não, mas existe uma certeza: após várias tentativas de cortejo, é possível declarar o amor e casar. Mas o fio coeso que une toda a experiência é a forma como esta recompensa o jogador. Nenhuma atitude ou acção passa despercebida, avançando uma estatística qualquer com o passar do tempo, seja ela dormir, caminhar, abanar uma espada ou um machado, tudo é contabilizado e visível para o jogador. Ao início pode parecer inofensivo e até irrisório, mas toda esta dinâmica funciona de uma forma inconsciente para que a vontade de avançar nunca se perca. É uma prazerosa e única sensação de bem-estar, proporcionando uma liberdade de escolha onde todas as respostas são corretas e nenhuma é errada.Já no aspecto visual, Rune Factory 4 Special não impressiona, e é até um pouco feio em alguns casos. Todos os modelos 3D estão trabalhados, assim como a interface gráfica para acomodar o ecrã da consola e os retratos das personagens, mas os cenários de fundo contrastam em demasia por serem tão desfocados. Isto agrava-se mais ainda quando jogado num ecrã de televisão. Conclui-se que o formato mais recomendável para a experiência é portátil. É imperativo mencionar o que faz deste Rune Factory 4 tão “especial”: para a Nintendo Switch foram elaborados dois novos modos intitulados “Newlywed” e “Another Episode”, que presenteiam o jogador com uma panóplia de cenários e sequências cinemáticas, explorando os acontecimentos a várias personagens após o casamento. Está disponível também um novo modo de dificuldade para quem deseja um nível de desafio superior. É uma adição estranha face a um jogo tão relaxante, mas está lá para quem o quiser acionar. De resto, nada mais de substancial, o que transforma a aquisição de Rune Factory 4 Special para os fãs uma compra a ponderar só após uma considerável descida de preço.
Conclusão
Dotado de uma jogabilidade viciante e um charme cativante, Rune Factory 4 Special é um autêntico bolo de coisinhas boas sem quase nenhum inconveniente. É bastante gordo no seu conteúdo, proporcionando várias horas de divertimento, e doce na execução da sua história e desenvolvimento de personagens. O seu travo amargo provém de modos pouco satisfatórios para os fãs do jogo anterior, assim como um trabalho visual inconsistente. Mas face a uma iguaria como esta, poucas são as razões para não considerar a aquisição do jogo.
O melhor
- Jogabilidade viciante e gratificante
- Aldeões de Selphia muito bem conseguidos
- Conteúdo para muitas horas
O pior
- Gráficos inconsistentes
- Conteúdo novo pouco relevante
Nota: Esta análise foi efectuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela Marvelous Europe.
18 de Março, 2020, 08:52