
ANÁLISE
Shin Megami Tensei: Devil Summoner: Soul Hackers
Um futuro com demónios e piratas.
Por Pedro Meleiro a
A passagem de Shin Megami Tensei (SMT) pela Europa certamente não ganha pontos pela assiduidade e pontualidade. Se por um lado, já lá vão os tempos anteriores à PS2, quando a série era uma miragem no velho continente, a verdade é que mesmo entre os títulos mais actuais existem ainda algumas ausências e os que cá chegam parecem ter atravessado o oceano à velocidade de um cruzeiro que é feito para demorar.
É assim curioso notar que este Soul Hackers, conversão com algumas melhorias do título homónimo (originalmente lançado em exclusivo para o mercado nipónico na segunda metade da década de 1990) e segunda entrada numa série secundária de SMT conhecida como Devil Summoner, chega à Europa com "apenas" alguns meses de atraso face à edição norte americana. Ainda mais intrigante, quando se pensa que títulos actuais e aparentemente apostas mais relevantes por parte da Atlus, como Strange Journey ou a versão original de Devil Survivor, não tiveram a mesma sorte de cá chegar. Não obstante esta série de infortúnios, a chegada de Soul Hackers pela primeira vez ao território PAL é muito bem-vinda e deveria servir de modelo a entradas sucessivas em SMT, ainda que o atraso de Shin Megami Tensei IV para 2014 não agoure nesse sentido.A acção de Soul Hackers decorre na cidade ficcional de Amami, numa altura em que foram abertas ao público as primeiras vagas de acesso a Paradigm X, um mundo virtual que propõe uma série de experiências imersivas que podem ser partilhadas com outros utilizadores ligados a uma rede electrónica. Todo o ambiente de jogo retrata a ficção científica típica dos anos 90, com os gadgets e outros artigos tecnológicos um tanto desencaixados da realidade actual a marcar presença incondicional. Com este novo mundo virtual chega também uma ameaça, a Phantom Society, que tem intenções de roubar a alma de todos aqueles que contactam com Paradigm X. O jogador encontra-se inserido no seio de um grupo de hackers, os Spookies, que pretendem varrer estes malfeitores para fora da rede. A história é fácil de acompanhar e decorre a bom ritmo, protagonizada por personagens e diálogos algo estereotipados.
Quem já antes tiver experimentado algum SMT certamente encontrará em Soul Hackers algumas semelhanças nos conceitos e mecânicas de jogo. O aspecto que mais salta à vista é efectivamente a possibilidade de dialogar, contratar e fundir demónios com que o jogador se depara ao longo da aventura. Estes podem ser invocados para auxiliar nas batalhas e cada um dispõe de um conjunto de habilidades e características que o torna único e mais apto a determinadas situações. Com isto surge também um outro traço característico da série, um grau de complexidade acima do comum dos RPGs.São vários os factores que o jogador deve ter em atenção para ser bem sucedido no campo de batalha por turnos proposto por Soul Hackers: para além do conjunto de características do protagonista e de Nemissa, que incluem as típicas variáveis como HP e MP, força de ataque, defesa, sorte, magia ou até inteligência, existem ainda vários perfis de demónios que desempenham um papel preponderante na acção. Estes têm uma de várias personalidades (como sly, calm ou dumb), que influencia a forma como o jogador deve interagir para garantir que os demónios cumpram mais fielmente as instruções dadas pelo jogador ao longo das rondas. Também a forma como o demónio é obtido (em batalha ou por fusão) pode influenciar o conjunto de magias resultantes e que podem ser mais ou menos relevantes de acordo com as estatísticas-base desse mesmo demónio. De realçar ainda a importância das fases lunares no comportamento dos demónios.
Existe uma infinidade de variantes a que o jogador deve prestar atenção para ser bem sucedido, ainda que o factor sorte desempenhe aqui também um papel preponderante, como é natural no género. Mas a dificuldade de Soul Hackers acaba por não acompanhar a complexidade do esquema de jogo, o que de certa forma deita um pouco a perder a elaboração de estratégias pensadas em detalhe, ainda para mas existindo opções de batalha para tornar a tomada de decisões automática.
A passagem do tempo, que se torna tão evidente em géneros como RPG, não foi devidamente tida em conta nesta conversão para a 3DS, transportando para o ano de 2013 resquícios de um título com uma interface desactualizada e pouco prática, navegação por níveis insípidos e desinteressantes, batalhas aleatórias que interrompem a acção do jogo constantemente e outras lições pouco populares nos dias que correm. Ainda assim,Soul Hackers foi um título importante no seu tempo e cheio de virtudes, maioritariamente ofuscadas por uma conversão que não teve a devida atenção.Entre as novidades na componente técnica desta versão portátil, de realçar a inclusão de sprites animados durante as batalhas, um novo vídeo introdutório e diálogos com vozes em inglês. Estão também presentes novos demónios, um dos quais, Nemechi, permite o uso de moedas obtidas pelo StreetPass para o fazer evoluir e permitir a compra de demónios. A dualidade entre a vertente social e a das masmorras (uma característica mais comum em iterações actuais da série) está também subtilmente presente em Soul Hackers, podendo influenciar o tipo de magia usado por Nemissa de acordo com as respostas escolhidas durante as fases de diálogo. De resto, a acção decorrida nas masmorras ocupa grande parte do tempo de jogo, com as interrupções na região de Amami a ocorrer para dar andamento à componente narrativa, permitir a compra e venda de equipamento e itens, câmbio entre as moedas MAG e iene (usadas para propósitos distintos), fusão e compra de demónios, acesso a Paradigm X, entre outras coisas.
Conclusão
Soul Hackers é na essência um bom RPG, próximo do que de melhor Shin Megami Tensei tem para oferecer. No entanto, é inevitável notar que os seus dias de glória já lá vão e que a passagem do tempo foi traiçoeira, carregando consigo uma série de características que hoje em dia não são muito bem-vindas. Esta conversão para 3DS corrigiu alguns desses elementos, mas ficou bem aquém do tratamento que ela poderia ter recebido. Ainda assim, para os admiradores da série vale sempre a pena dar uma espreitadela, bem como para quem estiver à procura de uma proposta RPG menos convencional, mas com consciência do trabalho que ficou por fazer nesta versão.
O melhor
- Estreia de Soul Hackers na Europa
- Uma proposta de qualidade para os apreciadores do género
O pior
- Conteúdo novo não traz nada de significativo
- Conversão com muito por onde melhorar
21 de Novembro, 2013, 15:36