
ANÁLISE
Zero Time Dilemma
Conclusão da trilogia Zero Escape.
Por Diogo Caeiro a
Zero Time Dilemma tem um grande problema...a posição ingrata em que foi colocado à partida. Para além de ter de suceder aos fantásticos 999 e Virtue’s Last Reward e ao mesmo tempo ter de resolver várias questões em aberto desses dois jogos, tem ainda de concluir a trilogia de forma satisfatória, o que não é nada mais nada menos que uma tarefa hercúlea, principalmente quando se tem em conta que este capítulo final esteve em risco de não existir e que as opiniões e acções dos fãs foram fundamentais para que Zero Time Dilemma se tornasse uma realidade.
A espera foi longa mas é finalmente 2016 e o jogo está disponível mundialmente, para regozijo dos fãs que dificilmente aguentariam mais tempo para saber da resolução de uma das melhores séries de videojogos dos últimos dez anos. Para os mais impacientes, Zero Time Dilemma (e toda a série Zero Escape) é obrigatório para os apreciadores do género aventura e também de visual novels e é uma conclusão que apenas poderá não satisfazer totalmente os fãs mais acérrimos da série, dado que esta não é tão detalhada nem tão completa como deveria ter sido.
Ao contrário de 999 e Virtue’s Last Reward, em que todas as personagens são participantes do Nonary Game, aqui o jogo é outro, denominado de Decision Game. Os nove participantes foram divididos em três equipas, cada uma com o seu respectivo líder que em determinadas alturas terá que participar no Decision Game, momentos em que são concedidas duas escolhas e apenas se pode optar por uma. Desta vez o jogo termina quando pelo menos seis dos nove participantes falecerem, pois são necessárias seis palavras-passe para abrir a porta que conduz às saídas que apenas são reveladas cada vez que alguém morre. Este nível de risco contribui para um dos melhores aspectos do jogo e talvez o único ponto em que consegue ser superior aos seus antecessores, com o seu incomparável sentimento de tensão e a ambiente macabro que acompanha o jogador ao longo de toda a aventura.
Outra mudança significativa passa pela utilização de sequências cinemáticas animadas com vozes que vêm substituir as imagens estáticas e a quantidade de texto que tinha de ser lido durante os jogos anteriores. É uma mudança bem-vinda e decididamente um passo em frente no que toca a colocar jogos do género num patamar superior, mas infelizmente esta medida não foi implementada da melhor forma. Enquanto a prestação dos actores que oferecem as suas vozes a cada personagem é muito boa, a animação dos modelos em 3D deixa muito a desejar para os dias que correm. Grande parte dos movimentos é rígida e pouco natural e a falta de expressão na cara das personagens que por vezes se nota em certos acontecimentos é algo preocupante. Os ângulos da câmara são também igualmente estranhos e muitas vezes sem sentido, seja por se estarem a focar a pessoa errada durante a conversa ou por parecerem estar a ter uma convulsão de forma a tentar tornar o que está ser visualizado numa experiência mais dramática.
De destacar que existem várias instâncias em que o conteúdo é muito gráfico e violento, mas dado o estilo artístico escolhido e a animação datada, certas mortes vão possivelmente arrancar um sorriso aos jogadores pela forma tão absurda como foram retratadas. O rácio de fotogramas é também pobre em certos momentos, fazendo questionar por vezes se esta troca na forma como é contada a história foi a mais acertada. Mesmo tendo em conta todos os seus problemas, a sua adição faz com que Zero Time Dilemma tenha mérito quando comparada com as outras duas entradas da trilogia, ao mesmo tempo que mantém a série fresca e consegue destacá-la das restantes ofertas num mercado que tem tido um crescimento bastante acentuado no Ocidente nos últimos anos, mesmo que os jogadores menos dedicados possam não notar.
Em termos de estrutura de jogo, Zero Time Dilemma é também um pouco diferente de Virtue’s Last Reward e 999. Mantendo o fluxograma de Virtue's Last Reward, agora é possível jogar secções específicas sem seguir qualquer ordem, sendo que ao completar determinadas secções com uma equipa faz com que se desbloqueiem outras secções de outra equipa e assim sucessivamente. O jogador tem também como objectivo ir reunindo as informações que cada equipa obtém nos seus fragmentos exclusivos que poderá posteriormente utilizar para desbloquear mais rotas com outras equipas e ir desta forma compondo a história como se fosse um puzzle, até ao momento final em que as histórias das três equipas eventualmente se cruzam e tudo o que parecia até ao momento estranho acaba por fazer sentido. Não existem tantos momentos de pura confusão e surpresa como em Virtue’s Last Reward mas existem algumas reviravoltas no decorrer da narrativa que certamente apanharão desprevenidos até os mais atentos e são esses os momentos para os quais este jogo (e toda a série, na verdade) vive.
A narrativa é muito interessante e bem composta, bem estruturada e com um seguimento lógico que progride a um ritmo bem delineado. O diálogo continua bastante bem desenvolvido e a caracterizição das personagens continua no ponto, sejam elas caras habituais da série ou não. A forma como é contada toda a história é também cativante e formulada de forma a manter o jogador agarrado à consola o tempo todo que seja possível só para avançar um pouco mais na história e descobrir que obstáculo o grupo de personagens terá de enfrentar a seguir. Outro ponto positivo que envolve a narrativa do jogo passa por não ser algo linear e exigir do jogador atenção e capacidade de raciocínio, algo que está pouco presente nos videojogos de hoje em dia. Imensos temas, ideais, teorias e histórias são aqui abordados e o jogo apenas se restringe a explicar o essencial sobre cada um desses tópicos, fazendo com que o jogador procure saber mais por si próprio e tire também as suas próprias conclusões sobre cada um e qual o seu lugar e relevância na história. Nenhum elemento das conversas ou exposição da narrativa é desperdiçado e quando não se está a aprender mais sobre a situação actual das personagens está-se a fazer progresso noutras frentes, tais como os motivos do vilão, que acontecimentos originaram determinadas ocorrências que se verificam ao longo do jogo, entre outras mais. Em nenhuma instância Zero Time Dilemma agarra o jogador pela mão e indica qual o melhor caminho a seguir ou qual a melhor opção a tomar e é apenas desejável que mais produtoras se apercebam das possibilidades que se abrem quando apenas o essencial é facilitado aos jogadores para que possam ser eles a jogar por si próprios.
E como não poderia deixar de ser, as secções em que tem de se escapar de uma sala resolvendo determinados puzzles estão de volta, se bem que já viram também melhores dias. Não são maus nem desinteressantes, mas são decididamente dos mais fracos e simples que a série já viu, sendo que por vezes a solução de certas componentes do puzzle não são muito lógicas e passam mais por uma fase de tentativa de erro do que propriamente descobrir a sua solução por se perceber qual é exactamente a sua constituição e objectivo. Destaque especial para a composição sonora, que está novamente fantástica e se adequa perfeitamente a todas as situações, com faixas durante as secções de puzzle em que o som é mais melancólico e minimalista assim como mais acelerado e caótico em momentos de grande tensão.
Zero Time Dilemma é muito bom mas poderia facilmente ter sido uma obra-prima caso os valores de produção fossem um pouco mais elevados e se não existissem tantas pontas soltas que tivessem de ser atadas com o seu lançamento. Enquanto que 999 foi mais contido na sua informação, Virtue’s Last Reward foi incrivelmente ambicioso na sua quantidade de conteúdo, introduzindo imensas variáveis, teorias e informação à trama principal que mereciam ter uma melhor conclusão da que foi aqui apresentada e é essa a principal razão que faz com que este não se eleve ao pedestal onde muitos gostariam de o ver. Tal como foi referido no início, a espera criou expectativas pouco realistas, fazendo de Zero Time Dilemma um jogo muito bom que poderia ter sido, quem sabe, um marco absoluto no género e até mesmo um jogo de referência da sua geração. Falhou, mas pouco.
Conclusão
Para aqueles que seguem a série desde o primeiro título, não há absolutamente nada a dizer, quem não o esteja a jogar já vai certamente fazê-lo em breve.Zero Time Dilemma é uma conclusão muito boa para a trilogia Zero Escape e pouco mais há a dizer sem que se comece a redigir extensas muralhas de texto de modo a justificar porque é que este jogo (e a série inteira) devem ser jogados. Quem não o fizer vai estar decididamente a perder.
O melhor
- Excelente narrativa
- Elenco de personagens interessante e bem desenvolvido
- Componente sonora bem executada
O pior
- Framerate de sequências cinemáticas por vezes pobre
- Algumas pontas soltas na história por resolver
Nota: Esta análise foi efectuada com base em código final do jogo para a Nintendo 3DS, gentilmente cedido pela Nintendo.
14 de Julho, 2016, 12:55