
ANÁLISE
Alchemic Dungeons
Alquimia de bolso.
Por João Dias a
Alchemic Dungeons para a 3DS insere-se num estilo conhecido como “Roguelike”. Desengane-se assim quem olhar para a direcção artística e para o aspecto visual do jogo e pensar que está perante um jogo de aventuras ou RPG em homenagem aos títulos das consolas de 8-bit. Em Alchemic Dungeons o ênfase não é na exploração ou no enredo (que não existe), o objectivo é terminar as ditas masmorras e fazer uso da alquimia (designação de um antepassado da ciência química) para desenvolver as capacidades da personagem e vencer os inimigos que se encontram pelo caminho. O jogo chega à eShop da 3DS pela mão da Circle Entertainment, depois de dois anos de presença no mercado dos dispositivos móveis. Se o original foi desenvolvido pela nipónica Q-Cumber Factory, a versão 3DS foi adaptada pela Flyhigh Works.
A mecânica é simples: em cada nível, o jogador vai escolher uma entre quatro personagens (representando classes diferentes, como é habitual em jogos semelhantes) e vai ter de chegar ao fim de vários andares ou pisos, como lhe chama o jogo – isto porque a forma de passar ao andar seguinte é através de umas escadas. Ao chegar ao último andar de cada nível, encontra-se um cristal e pode-se aceder ao nível seguinte. A nomenclatura parece estranha em níveis que têm lugar em cenários naturais como florestas, desertos, montanhas, etc. Como é convencional neste estilo, os níveis são gerados aleatoriamente e consistem apenas em entidades geográficas, sem quaisquer aspectos de exploração – o fundamental é chegar ao fim, apanhar objectos e, porque não?, matar inimigos, já que isto permite aumentar os pontos de experiência.
Vistos estes aspectos, é importante realçar que Alchemic Dungeons funciona por turnos mas ao contrário daquilo que seria habitual, a organização do jogo não é óbvia à partida: cada passo ou cada acção do jogador faz avançar um turno, o que leva por sua vez a uma acção dos inimigos. Se o jogador der cinco passos, o jogo conta isto como cinco turnos. À partida pode ter aspecto de um jogo que funciona em tempo real mas é preciso não esquecer na primeira vez que se joga que funciona por turnos e que isto tem a sua influência na experiência de jogo, já que cada acção custa um turno – se o jogador estiver ao lado de um inimigo e em vez de o atacar, escolher tomar uma poção, isto deixa o jogador livre para o inimigo atacar durante um turno. Existem também várias poções e magias que têm uma durabilidade limitada a cinco, dez ou trinta turnos, por exemplo. Finalmente, existem dois indicadores fulcrais que dependem dos turnos: a saúde do jogador e o nível de fome. A saúde é recarregada à medida que os turnos passam, enquanto o indicador de fome se agrava com a passagem dos turnos numa escala mais lenta. É por isto que é fundamental ter sempre no inventário alguma comida que permita reduzir a intensidade da fome, já que os ferimentos de combate se regeneram com a passagem dos turnos – pelo menos até ao próximo combate.De um título simples com um preço de €5 não se espera uma extravagância audio-visual e Alchemic Dungeons apresenta os serviços mínimos neste aspecto, com um visual marcadamente 8-bit e uma banda sonora e respectivos efeitos dentro do mesmo comprimento de onda. Algo que não é de elogiar nem de criticar, já que os níveis de Alchemic Dungeons não são mais do que locais acidentais a percorrer e o pormenor visual das personagens não representa nada de demasiado importante para a experiência do jogo. É fácil de perceber quem é inimigo e o que representam os objectos e isso já chega embora a variedade de inimigos seja bastante saudável.
Explicada a organização do jogo, como funciona então a parte da alquimia? Um pouco por todo o lado, encontra-se uma grande variedade de recursos. Estes vão dos mais simples e abundantes, como pedras, paus, algodão, minério de ferro ou ervas, a elementos mais apetecíveis como ouro e outros metais raros, anéis que aumentam as capacidades do jogador e ingredientes que podem ser usados em fórmulas mais ambiciosas. Todos os objectos e elementos que o jogador transporta podem ser misturados em fórmulas bastante simples que servem para criar armas mais poderosas, preparar poções com uma grande variedade de efeitos (restaurar a saúde, paralisar inimigos, evitar armadilhas, etc), produzir novas armaduras, capacetes, varinhas mágicas, comida, etc. É igualmente possível colocar “encantamentos” nas armas, armaduras e restantes acessórios para lhes conferir efeitos que podem muito bem salvar a vida em não raras ocasiões, fazendo o jogador sentir-se uma espécie de MacGyver de um mundo de fantasia (mas com mortes à mistura).
É importante lembrar: desde o início que é fundamental criar novos objectos a partir dos materiais encontrados, mesmo os mais simples. Quem ignorar este aspecto vai passar ao lado de um pilar do jogo e morrer rapidamente, já que quando se vir cercado por três ou mais inimigos é absolutamente essencial fazer uso das fórmulas que o jogo permite. Não é preciso arrancar os cabelos para descobrir que elementos são precisos para o quê, o jogo nos seus menus informa quais as combinações possíveis e como produzir elementos que por sua vez, vão ser em seguida usados para criar outros objectos. Isto é bastante prático, já que permite saber praticamente tudo por antecipação mas está feito de uma forma que consome muito tempo. Entre ir ao menu, seleccionar a opção, seleccionar os elementos a misturar e, se for esse o caso, juntar o resultado de uma fórmula a outro elemento para criar algo mais ambicioso, perde-se bastante tempo. Não se trata de tempo de jogo, já que um turno apenas pode ser gasto se o jogador realizar uma acção mas há bastantes momentos, sobretudo em pontos mais avançados do jogo, em que se passa demasiado tempo em menus, a seleccionar opções e ingredientes.A mecânica dos turnos também leva a que os combates possam facilmente levar a uma morte antecipada e quando isto acontece, o jogador morre sem possibilidade de continuar onde estava – a menos que tenha equipado um anel de regeneração mas quando assim não é, mesmo que se esteja no último andar de um nível, se a saúde chegar ao fim, o jogo também chega e recomeçar o nível do início é desmotivante. Alchemic Dungeons guarda os níveis que o jogador passou mas apenas permite continuar dentro de um determinado nível se o jogador sair através da respectiva opção, não em caso de morte.
Se nos momentos iniciais, Alchemic Dungeons parece algo vazio, nos momentos mais avançados passa para o extremo oposto e em algumas situações larga hordas de inimigos em cima do jogador, que obrigam a passar bastante tempo a criar objectos e poções para escapar à morte. Um lapso pode ser fatal e por vezes basta um inimigo atingir o jogador com um golpe incapacitante – algo que provoque confusão ou lentidão – num momento em que não se esteja preparado e rapidamente é o descalabro. Fosse Alchemic Dungeons um jogo mais rico e com mais ênfase na exploração e talvez isto pudesse ser mais facilmente aceite mas sendo este um jogo declaradamente simples, parece despropositado incentivar o jogador a ir para a frente em direcção ao fim de cada andar só para depois o encurralar e obrigar a repetir o nível desde o início.
Conclusão
O grande problema de Alchemic Dungeons recai menos na alquimia propriamente dita mas antes na segunda palavra do seu nome. Pode ser gratificante criar armas e desenvolver poções e outros elementos que melhorem as capacidades do jogador mas o percurso dos níveis não é cativante e a forma como o jogo está organizado acaba por tornar a experiência em algo demasiado repetitivo e mesmo frustrante, sobretudo quando se chega a um ponto avançado em cada nível e por causa de uma vaga de monstros, tem de se voltar ao início. Talvez sendo este um jogo originalmente pensado para dispositivos móveis onde os jogos normalmente requerem menos atenção, seja mais fácil pegar nele mais tarde e recomeçar, uma vez que não existe enredo. Seja qual for a sua intenção, Alchemic Dungeons não é um jogo que vá deslumbrar ou deixar muitos jogadores encantados, mesmo que a mecânica da alquimia seja interessante e podia beneficiar de um ambiente mais rico em conteúdo e com menos perdas de tempo.
O melhor
- A componente de alquimia foi bem desenvolvida
- Apresenta uma boa longevidade para um jogo simples
O pior
- Tem bastantes perdas de tempo devido à sua organização
- Níveis longos aumentam a probabilidade de deitar tudo a perder
- Algo vazio e desinteressante além da alquimia
Nota: Esta análise foi efectuada com base em código final do jogo para a Nintendo 3DS, gentilmente cedido pela Nintendo.