
ANÁLISE
Last Window: The Secret of Cape West
Por João Tavares a
Nesta nova aventura, Kyle Hyde encontra-se num cenário diferente. Depois de uma passagem breve por um hotel, o jogador é agora incentivado a abrir uma série de investigações num bloco de apartamentos onde o ex-detective vive. Apesar de Cape West aparentar não passar de um local de moradias comum, depressa a narrativa mostra que há algo mais para além deste conceito directo. Desde homicídios, até roubos, Kyle Hyde acaba por ser surpreendido ao saber que esses insólitos estão também associados à morte do seu pai. Se em Hotel Dusk o foco estava todo na investigação do seu parceiro policial, Bradley, em Last Window as luzes estão um pouco mais voltadas para a vida pessoal de Hyde, pelo que ficamos a saber um pouco mais da sua infância e dos traumas que carregou consigo ao longo de todos estes anos.

De nada seria um enredo sem boas personagens a colocá-lo em movimento, e Last Window repete a façanha do seu antecessor ao apresentar um conjunto de intervenientes simplesmente fantásticos. Todos dotados com personalidade única, cada morador do prédio tem uma história para contar e fá-lo de forma natural, através da ajuda preciosa de diálogos bem escritos. De facto, no que diz respeito a interacção entre Hyde e os demais, Last Window mantém a qualidade acima da média que já havíamos visto há três anos atrás, pelo que quem acompanhou e gostou da aventura anterior vai certamente sentir-se em casa com este novo jogo, onde existem alguns regressos e referências. É importante também referir que, mesmo que sejam novatos nas investigações de Kyle Hyde, não se vão sentir minimamente perdidos por não terem experimentado Hotel Dusk: Room 215, já que a narrativa afasta-se de certa forma dos acontecimentos do passado, e quando sente necessidade de se apoiar em algum evento do anterior jogo, a história consegue moldar-se de forma a fazer o jogador não se sentir perdido.
Numa tentativa de nos manter sempre localizados na trama, o jogo tem agora no seu menu um pequeno livro da autoria de Martin Summer, uma das personagens de Hotel Dusk, onde as ocorrências de cada um dos dez capítulos de jogo vão sendo escritas. Assim, podemos acompanhar a história, especialmente depois de termos feito uma longa paragem.
É inegável que Last Window é um jogo mais fácil de digerir do que o seu antecessor, não só por ter puzzles de resolução mais fácil, como também pelo simples facto de não divagar tanto. Continuamos a ter de ouvir as personagens a falar das suas vidas e dos seus problemas que nada trazem de útil para a nossa investigação, é certo, mas grande parte do tempo estaremos ocupados em desenterrar cada vez mais os segredos de Cape West, o que resulta numa experiência mais motivadora em que o jogador é consumido pela curiosidade e a certo ponto vê-se incapaz de parar de progredir. No entanto, mesmo sendo verdade que os puzzles estão mais acessíveis, e o nosso caminho sempre bastante delineado, e por isso mais amigável e fácil de apreciar, Last Window afasta-se bastante em termos de "digestão" comparativamente a outros do género. É um jogo pouco aconselhável aos mais novos, mas quase imprescindível para os mais velhos e experientes.

Existe ainda um novo sistema de ajuda, onde são abertos uns ficheiros que relatam um pouco mais da história e que nos apoiam na progressão do jogo. Mas, atenção, ao recorrerem a esta ajuda estarão a pôr em causa alguns do bónus que poderão ganhar após terminarem Last Window. Porém, até o próprio manual de instruções contém umas páginas especiais que terão de abrir para terem acesso a uma pequena pista para o puzzle mais complicado do mistério, o que acaba por dar um toque especial ao jogo.
Uma outra novidade prende-se com a possibilidade de podermos avançar algumas linhas de diálogo através da opção de ignorar, onde Kyle Hyde evita fazer perguntas, avançando assim mais depressa a conversa. Esta funcionalidade está longe de ser ideal para aqueles que pretendem apreciar tudo o que o jogo tem para oferecer, pois ao utilizarem-na estarão a perder alguma informação adicional que as personagens têm para vos contar, e que normalmente enriquecem o ambiente de jogo. Por outro lado, para aqueles que não têm tanta paciência para a conversa banal, é sempre bom terem à disposição uma ferramenta como esta que lhes possibilite ir directos ao assunto.
Um aspecto que acaba por cair mal na jogabilidade é a rotina demasiado acentuada de Kyle Hyde, em que este é despertado quase todos os dias por um telefonema e abordado à porta do seu apartamento sempre que dele sai pela primeira vez. Talvez a ideia dos produtores fosse mesmo a de passar a imagem de um dia-a-dia monótono que a vida de Hyde circunda, mas isto acaba por afectar um pouco a experiência de jogo, que se quer preferencialmente fresca e repleta de novidades. A juntar a isto está a linearidade excessiva que já se via em Hotel Dusk, com o jogador a ter pouco controlo sobre o destino dos acontecimentos, sendo obrigado a efectuar as perguntas certas nos momentos críticos para que a história avance como foi programada. Um pouco mais de liberdade, com um par de finais alternativos, teria sido excelente.

Tudo o resto é bastante semelhante ao que vimos em Hotel Dusk: Room 215. O controlo de Kyle Hyde continua a ser feito com o auxílio da stylus enquanto temos a DS numa posição vertical, como que se de um livro se tratasse, o que é perfeito visto estarmos a jogar uma novela interactiva. Os cenários estão um pouco mais polidos, o que também seria de esperar numa altura tão avançada no tempo de vida da portátil da Nintendo, mas continuam longe de impressionar. Mas no que diz respeito a causar boa impressão, Last Window continua a demonstrar todo o seu potencial visual recorrendo àquele estilo único de desenho das personagens em preto e branco, aproximando-se do que é a arte com grafite. Em certas alturas vemos as personagens ganharem cor, e certas sequências de história têm alguma animação e um espectro visual mais colorido, mas na maioria da aventura estamos sempre a dialogar com personagens que possuem uma personalidade extremamente realista e um aspecto ao qual os nossos olhos não ficam indiferentes. As animações dos moradores de Cape West não são muito variadas, mas também nunca estão fora de sítio e cumprem perfeitamente o seu propósito.
O que também regressa é a temática jazz que nos irá acompanhar ao longo das, sensivelmente, 15 horas de jogo, e que compõe graciosamente a banda sonora de Last Window. A qualidade musical não será uma surpresa para os que jogaram Hotel Dusk, mas é óptimo ouvir um trabalho em que a Cing não perdeu uma pitada de jeito. Preparem-se para muitas melodias que enriquecem ainda mais o cenário do jogo, consoante a nossa acção, seja a interrogar alguém ou a inspeccionar um local em busca de provas. Encaixa como uma luva, e recomenda-se que dêem um salto à Jukebox do jogo para poderem apreciar cada música desta setlist.
É caso para dizer que a Cing pode descansar em paz. É uma pena ver um dos mais interessantes estúdios ao serviço da Wii e Nintendo DS virar poeira, mas que ainda teve tempo de deixar uma última marca na portátil. Mesmo importando alguns defeitos do primeiro jogo, Last Window: The Secret of Cape West torna-se uma experiência ainda melhor, no geral. O enredo é envolvente e liga-se de forma mais sólida e lógica aos diversos fios de pistas espalhados pelo prédio e pelos seus moradores, constituídos por um novo conjunto de personagens muito trabalhadas e que têm um fundo historial brilhante. Quer sejam apreciadores de aventuras gráficas, ou não, este é um jogo aconselhável a todos os que buscam por uma experiência adulta e carismática. É provável que Last Window irá parar imediatamente à vossa prateleira depois de o terminarem, mas vão ostentá-lo com grande orgulho.
O melhor
- Mais acessível que o antecessor
- Enredo muito sólido e bem ligado
- Grafismo e faixas musicais de grande qualidade
O pior
- Repetição excessiva de algumas rotinas
- Linearidade poderá afectar a experiencia de alguns jogadores